sábado, 19 de maio de 2007

Filmes Superestimados (Parte 2)

Continuando no blog a série dos filmes superestimados dos últimos anos, irei fazer algo diferente. Vou contrapor um “clássico” moderno com um filme que quase ninguém conhece. Isso porque esses dois filmes, além de terem sido realizados no mesmo ano, versam sobre assuntos semelhantes, praticamente em torno do mesmo tema. Sempre lembrando que faço não exatamente uma análise técnica desses filmes, porém uma exposição das impressões que cada filme despertou em mim ao assisti-lo.

Matrix causou um estardalhaço muito grande quando foi lançado em 1999. Aclamado pela quase totalidade absoluta da crítica, sucesso mundial de bilheteria, embabascou meio mundo com sua mistura de artes marciais, filosofia, referências religiosas e místicas,influência dos quadrinhos e muitos outros conceitos divulgados à exaustão pelos críticos de plantão para alçar a produção dos Irmãos Wachowsky (que antes só haviam dirigido o interessante Ligados Pelo Desejo) à condição de maior evento cinematográfico do fim do século XX. Aqui no Brasil a Revista SET encarregou-se de ser a responsável pelos maiores elogios ao filme ditos por aqui, refletindo o que vinha virando tendência em publicações no resto do mundo. Já de saída falou-se em revolução cinematográfica, clássico instantâneo.

Enfim, às vezes tenho a impressão de que todo mundo gosta de Matrix. Menos eu. Deve ser porque eu não o entendi. Não fui capaz de chegar a tanto. Lembro que no lançamento em VHS cochilei entediado no meio do filme e tive que rebobinar a fita para não perder o fio da meada. Não adiantou. Deve ser difícil que nem filme de vanguarda, levando em conta os conceitos filosóficos que muitos juram que o filme possui. Devo precisar de burla para entender Matrix. Na época reli os textos dos críticos sobre o filme. Diziam tratar-se de um mundo alternativo gerado por um supercomputador que mantém os seres humanos presos e sob controle. Isso eu já sabia. Meses depois, dei uma segunda chance a mim mesmo (risos), e fui rever Matrix para reavaliar minha opinião. De nada adiantou: mais uma vez o odiei.

Durante cerca de uma hora o filme é chatíssimo, inócuo demais, nada acontece, aborrece muito e dá mesmo vontade de dormir. O que vemos ali é um verniz “cerebral” cheio de pretensões para fazer com que o espectador acredite que esteja vendo um filme por demais inteligente, cheio de conteúdo filosófico, meditações sobre o destino da humanidade etc. Depois dessa hora estafante vem um grande número de cenas de ação espetaculares, assumindo de vez a estética de videogame que o filme carrega. Se os efeitos especiais são espetaculares, isso confirma que os efeitos gerados por computadores estão evoluindo cada vez mais por causa dos bilhões de dinheiro aplicados na indústria. Porém um filme não pode ser apenas isso, e eu só aceito efeitos visuais que ajudem a contar uma história, não de um arremedo de tramas que sirvam para mostrar os tais famigerados efeitos. Configura-se diante dos olhos do público um espetáculo sensorial de muito mau gosto estético, em ritmo de videoclipe, imagens de videogame, reflexo de uma era dominada por tudo que é tipo de mercados publicitários. Até mesmo a trilha sonora não é mais que uma seqüência de sons para acompanhar os movimentos vertiginosos dessa montanha-russa cheia de adrenalina, fazendo com que se perca uma época em que clássico do cinema prezava em incorporar belas melodias à trilha que emoldurava cada uma de suas imagens. Como se isso não fosse o bastante, no final somos brindados com a célebre cena com Keanu Reeves se desviando de balas. Não gostei e muitos me explicaram (como se eu não soubesse) que aquilo acontecia porque o protagonista interage num mundo virtual. Isso quer dizer que os criadores do filme inventaram o conceito de universo paralelo como argumento para justificar os absurdos mais insanos do roteiro e entorpecer a platéia-escrava com os exagerados efeitos. Tudo porque é virtual. Por mais que uma ou que outra qualidade que Matrix possa carregar em suas entrelinhas, nada justificaria os vícios estéticos que, se com certeza já existiam muitos antes do lançamento de Matrix, fizeram com que se sobressaia cada vez mais nos filmes lançados após o primeiro volume da trilogia dos Irmãos Wachowsky.

É bastante curioso o fato de que também nesse distante ano de 1999, David Cronenberg ganhou o Urso de Prata em Berlim com o absurdamente desconhecido Existenz, um filme com um ponto de partida bastante semelhante ao de Matrix, em que os personagens também estão presos á uma realidade alternativa, só que em vez daquele supercomputador da história dos Irmãos Wachowsky, o mundo paralelo bolado por Cronenberg é a partir de um jogo de RPG. Um casal perseguido por fanáticos religiosos que os ameaçaram de morte experimentam na fuga um mundo de imagens simuladas pelo jogo onde o cibernético e o real parecem não existir, e onde nada é o que aparenta ser. Para interagir nesse jogo que, com a perseguição dos vilões, transforma-se numa disputa de vida ou morte, são necessários um console de videogame feito de DNA e órgãos sintéticos, conseguidos pela invenção de mutantes anfíbios, um orifício, similar a uma tomada, instalado no final da medula espinhal do individuo, e um cordão umbilical para conectar o console ao sistema nervoso central dos integrantes do jogo. Os extremistas que perseguem o casal responsável pela manutenção do jogo pretendem que liquidando com a dupla possam acabar com o tal jogo de realidade virtual para sempre. Pronto, com isso está desfeito a separação entre mundo virtual e o humano, a mesma premissa que o filme estrelado por Keanu Reeves.

A diferença básica entre os dois filmes é que aqui não somos bombardeados com o excesso de efeitos especiais na tela, em nenhum momento Cronenberg lança mão de um visual de games para fisgar platéias. A história flui levemente e envolve a todo o momento, sem nos deixarem entorpecidos com os vícios visuais de ultima geração. A estética é mais verossímil, o que aproxima ainda mais o mundo apresentado do filme ao próprio mundo em que estamos vivendo. Não há aqui a necessidade de lutas coreografadas, e tudo parece tão real e verdadeiro, suas imagens são despojadas e tampouco provocam náuseas. Também não há a monotonia irritante de Matrix, pelo contrário, Existenz passa rápido como deve ser uma diversão pura e simples que mesmo assim provoca reflexões (como o pretendido por Cronenberg, aqui num de seus filmes mais acessíveis, menos esquisitos), só que sem o peso de pretensões que o roteiro do outro filme carrega. E como nos encantamos com os heróis e torcemos por eles, na certa porque são interpretados por gente tão talentosa, simpática e natural quanto Jennifer Jason Leigh e Jude Law (além de Williem dafoe e Iam Holm, que também estão por ali), e não pelo sisudo e esforçado Keanu Reeves com cara de messias (ator e filme em Matrix se levam á sério demais). Por fim, no filme de Cronenberg são os momentos dramáticos que nos tiram o fôlego, e não as cenas de pancadarias irreais e inverossímeis de tantos filmes pós-modernos.

Se Existenz é superior, então porque matrix é que foi um sucesso tão grande e se tornou um jargão na boca do povo? Deve ser porque Matrix teve toneladas de publicidades investidas por um grande estúdio e, aliado ao peso do nome de Keanu Reeves à monstruosa campanha de marketing funcionou para transformar matrix em grife e atrair o grande publico. Sei lá. Mas que Existenz é melhor, isso é.


3 comentários:

Everton disse...

Confesso que vi Matrix quando era muito criança e não entendi "bolhufas". Pra variar, o que me chamou a atenção naquela época foram as cenas de ação hhehehe.
Pretendo em um futuro não tão proximo (heheheheh) reve-lo e dar uma nova chance. Quanto ao filme do Cronenberg ainda não tive a oportunidade de ver nenhum de seus filmes mas pretendo um dia.

Paulão Fardadão Cheio de Bala disse...

Pois o engraçado é que, se vc está num mundo virtual em que no fim das contas se pode tudo, pq não haveria de haver cenas consideradas impossíveis?

Acontece exatamente aquilo que o texto afirma ser indispensável numa história q envolva ação, os efeitos ajudam a contar o quanto o mundo é sem fronteiras. Tanto o virtual, quanto o real, no meu modesto entender.

O problema com Existenz é que ele é parado, como que restrito a situações menores, idividuais, enquanto que Matrix tem um ar épico, o destino do mundo está ali, não são corporações ou sistemas econômicos, é a raça humana q está ameaçada, ou sequer talvez existiu...

Vlademir lazo Corrêa disse...

Pois é, Paulão não é todo mundo que consegue engolir cenas impossiveis.Por isso que sempre procuro postar opiniões extremamente pessoais, nunca deixando de comentam qual a visão do resto do mundo sobre cada filme(no caso de Matrix, não deixei de falar do reconhecimento consagrador qwue teve no mundo inteiro).

De fato, é uma questão de preferência. Prefiro bem mais os ares intimistas do filme estrelado por Jude Law do que as pretensões épicas da fita dos Irmãos Wachowsky.

Mas seja bem-vindo Paulão, volte sempre e obrigado por sua presença.
Um abraço

Movimento Cinema Livre

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