sábado, 7 de abril de 2007

Jean-Luc Godard (Parte 2) - Acossado




Falta lançar meu olhar em direção à dois dos mais famosos filmes de Jean-Luc Godard, feitos no auge de sua carreira: Acossado (1960), e O Desprezo (1963). Um tempo em que Godard era Deus. Ou pelo menos era tido como tal. Um tempo muito distante.

Acossado, o longa de estréia do cineasta, está para a década de 60 como Pulp Fiction está para os anos 90. Não que os dois filmes sejam iguais, pelo contrário. Só que da mesma forma que o filme de Quentin Tarantino, Acossado foi uma influência avassaladora na cultura cinematográfica dos anos 60. Depois dele, todos os outros cineastas tiveram que modificar a forma de realizar um filme para que não soassem anacrônicos. O jeito de filmar dramas ou comédias das décadas anteriores não servia mais para o público daquela geração. Todos tiveram que se moldar a partir do novo caminho proposto por Godard e seus companheiros de Nouvelle Vague. Hollywood demorou alguns biênios para render-se às evidencias e o resultado foi o desmoronamento das antigas fórmulas que garantiram o sucesso dos seus enlatados. As platéias da época não estavam mais interessadas em assistir épicos ambientados na Antiguidade clássica ou comediazinhas agridoces estreladas por Doris Day. O resultado foi o sucessivo fracasso desses tipos de filmes e o florescimento de um novo e forte cinema em vários paises da Europa e América Latina. Todos influenciados pelo êxito de
Acossado, que abriu caminho para um “cinema mais livre e pessoal”.

Godard visivelmente bebeu dos filmes policiais americanos para criar (com o auxilio de François Truffaut, roteirista) o enredo do assaltante perseguido pela policia que interrompe a fuga para convencer seu novo amor a acompanhá-lo, começando por desconsiderar o acadêmico cinema francês daquele tempo. O diretor serviu-se de uma história simples para renovar a maneira de se contar um filme, despojando-se das convenções tradicionais da narrativa cinematográfica. Com pouquíssimos recursos, quase que com apenas uma câmara na mão e cheio de idéias na cabeça, construiu uma narrativa fragmentada, desarmoniosa, espontânea e improvisada, aparentemente leve, só que nem sempre de fácil assimilação. O que mais nos incomoda é o rompimento da estrutura clássica que gira em torno do esquema “exposição, intriga, clímax e desenlace”. Essa receita não é seguida à regra, o que obriga o espectador a uma reeducação cinematográfica para melhor assimilar o produto. É como se Godard abrisse mão da montagem habitual do cinema para empregar a edição truculenta que constituí os fragmentos de pessoas do mundo real. Também se rompem as definições de heróis e vilões. Dentro de um enredo que não é imediato e nem concreto, os personagens, em suas incoerências, são desprovidos de unidade psicológica definida e precisa para apresentar sentimentos dúbios e controvertidos. De uma ou outra maneira, os protagonistas são vitimas do desenvolvimento caótico e das mudanças impostas pela incongruência da desordem do tempo.

Assisti Acossado pela primeira vez no mês passado. Quase odiei. Sua ruptura violenta dos métodos clássicos de narrar um filme pareceu-me gratuita e cansativa, suas citações de obras literárias, a meu ver, pouco ou quase nada acrescentavam, tudo não passaria de um pretexto de uma hora e meia até chegar à bela cena final quando o personagem toma o tiro, morre e depois olha para a câmara... Uma cena linda e impactante. Pareceu-me datado, levando em conta que, se na época do lançamento era revolucionário, posteriormente todos os filmes que se seguiram e trilharem a trilha aberta pelo clássico de Godard houveram de expandir o caminho com novas reformulações, tornando Acossado uma envelhecida peça arqueológica de museu, ao contrário de outras obras-primas inovadoras como Cidadão Kane, Encouraçado Potemkin e Nascimento de uma Nação, que resistiram melhor ao tempo. O que era rebelde a quarenta e sete anos, hoje já não o é, torna-se ultrapassado pelo correr dos anos. Enfim, nada que uma revisão não resolva. Reassisti o filme na ultima quinta-feira, e o fato de já conhecer o que havia de enredo no filme levou-me a prestar melhor atenção não tanto na história, mas no modo como ela era contada, e envolver-me mais em outros fatores, como o charme esperto imprimido por Godard no andamento sincopado do seu filme, o cinismo irônico naquele novo estilo narrativo, o brilho por trás do vazio aparente daquelas (então) novas tendências estéticas. Claro que hoje em dia, pelos motivos que comentei logo acima, o filme não deve ter o mesmo impacto do que na época de seu lançamento. No entanto, concluí que um filme antigo pode até ser ruim, mas se ele com o passar dos anos ainda é comentado, se continua despertando o interesse e a apreciação de novos cinéfilos, então é porque ele não é datado não. Datado é tudo aquilo que ninguém quer mais ver porque seu tempo passou. E Acossado, realmente, conserva (se não todo) pelo menos muito de seu brilho incomum.









Um comentário:

Unknown disse...

E ai veu velho !
Vim aqui para retribuir as palavras e pela a visita . Parabens pelo teu blog,gosto muito de cinema e com certeza esse espaço é de alto nivel..
Grande Abraço

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